Possíveis soluções na ordem jurídica brasileira
Sergio Pereira Diniz Botinha e Manuella Bambirra Cabral:
Advogados sócios. O escritório iniciou suas atividades em 1999 sob
administração exclusiva de Sergio Botinha. Em 2005, Manuella Cabral
começou a fazer parte do escritório, prestando serviços advocatícios e
em 2007 se tornou sócia, formando uma parceria sólida e eficaz.
Com o avanço do processo de globalização e o conseqüente aumento da
migração de pessoa para diferentes países as relações civis passaram a ter uma nova
configuração, envolvendo cidadãos de nacionalidades diferentes. A legislação brasileira
atual não consegue abarcar todas as questões do cotidiano e, muitas vezes, não
apresenta soluções para determinadas questões, principalmente quando esbarra nos
limites territoriais e torna-se necessário um direito internacional que resolva conflitos de
ordem privada no qual as pessoas envolvidas possuem nacionalidades e domicílios
diferentes.
“Força é acentuar que o casamento é o ato jurídico que mais
oferece campo às discussões em torno aos conflitos
interespaciais que freqüentemente gera, dada a minuciosidade
com que é regulado pelas leis internas e a maneira diversa
pela qual as questões são encaradas e resolvidas.”1
Situações acerca do Direito de Família, envolvendo brasileiros com estrangeiros,
tem a base de suas respostas na Lei de Introdução ao Código Civil, como bem podemos
ver:
Art. 7
o A lei do país em que domiciliada a pessoa determina as regras sobre
o começo e o fim da personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de
família.
§ 1º Realizando-se o casamento no Brasil, será aplicada a lei
brasileira quanto aos impedimentos dirimentes e às formalidades da
celebração.
§ 2º O casamento de estrangeiros poderá celebrar-se perante
autoridades diplomáticas ou consulares do país de ambos os nubentes.
(Redação dada pela Lei nº 3.238, de 1º.8.1957)
1 Comentários Teórico e Prático da Lei de Introdução ao Código Civil, Rio de Janeiro. Livraria Jacinto
Editora, 1944, vol. lI
§ 3º Tendo os nubentes domicílio diverso, regerá os casos de invalidade do matrimônio a lei do primeiro domicílio conjugal.
§ 4o O regime de bens, legal ou convencional, obedece à lei do país em que tiverem os nubentes domicílio, e, se este for diverso, a do primeiro domicílio conjugal.
§ 5º – O estrangeiro casado, que se naturalizar brasileiro, pode, mediante expressa anuência de seu cônjuge, requerer ao juiz, no ato de entrega do decreto de naturalização, se apostile ao mesmo a adoção do
regime de comunhão parcial de bens, respeitados os direitos de terceiros e
dada esta adoção ao competente registro. (Redação dada pela Lei nº 6.515,
de 26.12.1977).
§ 6º O divórcio realizado no estrangeiro, se um ou ambos os cônjuges
forem brasileiros, só será reconhecido no Brasil depois de 1 (um) ano da data
da sentença, salvo se houver sido antecedida de separação judicial por igual
prazo, caso em que a homologação produzirá efeito imediato, obedecidas as
condições estabelecidas para a eficácia das sentenças estrangeiras no país. O
Superior Tribunal de Justiça, na forma de seu regimento interno, poderá
reexaminar, a requerimento do interessado, decisões já proferidas em pedidos
de homologação de sentenças estrangeiras de divórcio de brasileiros, a fim de
que passem a produzir todos os efeitos legais. (Redação dada pela Lei nº
12.036, de 2009).
§ 7o Salvo o caso de abandono, o domicílio do chefe da família estendese ao outro cônjuge e aos filhos não emancipados, e o do tutor ou curador aos incapazes sob sua guarda.
§ 8º Quando a pessoa não tiver domicílio, considerar-se-á domiciliada
no lugar de sua residência ou naquele em que se encontre.
Art. 15. Será executada no Brasil a sentença proferida no estrangeiro,
que reúna os seguintes requisitos:
a) haver sido proferida por juiz competente;
b) terem sido os partes citadas ou haver-se legalmente verificado à
revelia;
c) ter passado em julgado e estar revestida das formalidades
necessárias para a execução no lugar em que ,foi proferida;
d) estar traduzida por intérprete autorizado;
e) ter sido homologada pelo Supremo Tribunal Federal.
Porém a r. Lei carece de atualizações e reformulações para atender os mais
amplos valores e tipos de famílias atuais que surgem no cenário brasileiro e
internacional.
Formalmente, o divórcio regularmente obtido em outro país dependerá, no
Brasil, para que possa valer o novo estado civil (qual seja, o de divorciado) e demais
conseqüências, do prévio reconhecimento pela Justiça Brasileira. Este reconhecimento é
feito através do processo de homologação de sentença estrangeira, proposto perante o
STJ – Superior Tribunal de Justiça em Brasília.
É dada ainda a opção de, ao invés de proceder com o reconhecimento do
divórcio feito no exterior, pode-se fazer o divórcio direto no Brasil. Desta forma há um novo divórcio, seguindo leis brasileiras e não mais uma homologação do divórcio estrangeiro. Segundo Yussef Cahali: “não homologada a sentença estrangeira de
divórcio, subsiste na sua eficácia o vínculo matrimonial de modo a possibilitar que os
cônjuges aqui domiciliados postulem a dissolução do vínculo matrimonial segundo a lei
brasileira, embora já divorciado o casal no estrangeiro.”2
Perante esta questão, ressalta-se a existência de um vácuo legislativo em relação
à eficácia de novo casamento sem antes se proceder com a homologação ou o divórcio
direto no Brasil do primeiro casamento. Há divergentes correntes doutrinárias, dentre
elas, a também corroborada neste artigo, de que a falta da homologação da sentença de
divórcio não constitui, por si só, causa de nulidade de novo casamento: o novo
casamento seria apenas anulável, no pressuposto de não vir a ser homologada a sentença
de divórcio. Assim nos ensina a doutrina quando estabelece que as hipóteses que
acarretam a nulidade absoluta do casamento são consideradas insanáveis, ou seja, não
podem ser convalidadas, ainda que as partes assim o pretendam.
“Se a pessoa foi divorciada no estrangeiro e se casou no Brasil
sem ter havido homologação da sentença estrangeira por ser
domiciliada no Brasil, não é nulo o casamento, mas sim ineficaz no
Brasil; faz-se eficaz desde que se dê a homologação”.3
“O novo casamento do divorciado nacional, ou do estrangeiro
antes de casado com pessoa nacional, inclui-se na categoria
genérica do casamento simplesmente religioso, ainda não
registrado”.4
O art. 32 da Lei 6015/73 (Lei de Registros Públicos) considera o assento de
casamento de brasileiro em país estrangeiro autêntico, nos termos da lei e do lugar em
que for feito. Neste sentido, é o nosso entendimento que se na época do casamento no
estrangeiro ambos os cônjuges eram desimpedidos segundo legislação local, o
casamento é válido, passando a ter eficácia no Brasil após o seu registro. Dando
continuidade ao artigo em tela, o § 1º dispõe que os assentos de que trata este artigo
serão, porém trasladados nos cartórios do 1º Ofício do domicílio, ou na falta deste, no 1º
Ofício do Distrito Federal, quando tiverem que produzir efeitos no Brasil. Ou seja, o
casamento é válido, mas não produz efeitos no Brasil antes de seu devido registro.
Na lei de Registros Públicos não há exigência e nem a dispensa da homologação
de sentença de divórcio estrangeiro, que posteriormente tenha contraído nova núpcias.
O art. 32, simplesmente não tratou do assunto. É que a mencionada matéria não
pertence aos registros públicos e sim ao Direito Internacional Privado, mais
precisamente previsto no art. 7º e 15º da Lei de Introdução ao Código Civil ( Dec-lei
4657/1942). Em tais artigos também não fica clara a necessidade da prévia
homologação para que tenha validade o casamento contraído anteriormente no exterior.
O problema tem suscitado controvérsias nos tribunais e na doutrina, havendo precaver futuros problemas, como questões hereditárias. Explicitamos com a seguinte situação: brasileiros casados no Brasil, divorciam-se nos EUA, a brasileira casa-se
novamente com americano e não registra seu novo casamento no Brasil, como também
não homologa seu divórcio. Seu ex marido brasileiro falece. Ela teria direito a herança?
No Brasil, ela consta ainda como casada, mas de fato ela já é divorciada e casada pela
segunda vez. Há ainda a questão da disposição de bens imóveis localizados no Brasil, o
cônjuge precisaria da outorga uxória, já estando divorciado no exterior, mas não tendo
ainda homologado a sentença no Brasil? De certo estas situações causariam imenso
problema no futuro, demonstrada, então a importância e necessidade da homologação
do divórcio, como também do registro no Brasil do novo casamento.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Araujo, Nadia de. Direito Internacional privado: teoria e prática brasileira – 3. Ed.
Atualizada e ampliada – Rio de Janeiro: Renovar, 2006.
Cahali, Yussef Said, Divórcio e separação – 11. ed. Ver. Ampl. E atual de acordo com
o Código Civil de 2002. – São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2005.
Comentários Teórico e Prático da Lei de Introdução ao Código Civil, Rio de
Janeiro. Livraria Jacinto Editora, 1944, vol. lI.
Pizzolo, Amanda. Tenfen, Maria Nilta Ricken. Manual do casamento: do início ao
fim – Tubarão: Preotoriana, 2005.
Pereira, Rodrigo da Cunha. Divórcio: teoria e prática – Rio de Janeiro: GZ Ed., 2010.
Pereira, Rodrigo da Cunha. Afeto, Ética, Família e o novo Código Civil – Belo
Horizonte: Del Rey, 2004.
Tiburcio, Carmen. Temas de Direito Internacional – Rio de Janeiro: Renovar, 2006.